Raúl Brandão não podia ver uma árvore sem espanto e das pedras extraía-lhes a ternura.
As árvores são mais que os
frutos que nos mostram; são as memórias de quando as víamos, sejam sombras de
descanso e de espera, ou ventanias de inquietação.
E sabe bem recordar a pedra e o bosque onde esperávamos, e não é mau percebermos as causas e os remédios das horas dolorosas.
Tenho nos olhos a figueira da
horta dos avós; as tílias à volta da igreja da aldeia do meu nascimento; a
amoreira, a nogueira e uma oliveira de sítios doutro modo de nascer.
Ainda me está no peito a
japoneira e a pedra musgosa ao lado: foi onde li, da Odisseia, as treze
pereiras, dez macieiras, quarenta figueiras do pomar de Laertes. O velho pai
tinha ensinado ao filho os nomes que lhes pertenciam: “tu disseste-me os nomes
e explicaste como era cada uma”, disse o filho, e o pai “atirou os braços em
torno do filho”,
e “o espírito voltou ao coração” *
A japoneira, e a pedra sua companhia, eram farol de um jardim meditação de monges.
A tradição rabínica lê o primeiro sentido das árvores igual aos sentidos dos mensageiros: as árvores não são só frutos e sombra. Isso é coisa de olhos desatentos.
São sobretudo aquilo que nos anunciam.
Por isso, é bom olhá-las e os sítios em que nos conheceram. E onde as fixámos.
Elas sabem-nos nos lugares certos e são mensageiras das nossas memórias.
Há árvores que conhecem a casa onde moramos. E são nossas visitas.
Carreiro da Lama, 21/Jan/2022