30.11.12

As crianças não compreendem a idade, para elas quarenta ou oitenta anos são a mesma desgraça. Uma vez nas escadas ouvi Maria perguntar à avó se era velha. A avó respondeu que não, Maria perguntou se o avô era velho e a avó respondeu que não. Então Maria perguntou: "Mas então os velhos não existem?", e ganhou uma bofetada. Eu compreendo os anos das pessoas, mas não os de Rafaniello. Na cara tem cem anos, nas mãos quarenta, no cabelo vinte, todo ruivo e desgrenhado. Nas palavras não sei, fala pouco com uma voz muito fina. Canta numa língua estrangeira, quando varro o seu canto faz-me um sorriso e movem-se as rugas e as sardas, parece o mar debaixo da chuva.

(Erri de Luca, Montedidio; tradução de Simonetta Neto; Bertrand, Lisboa 2012)

2 comentários:

Rui Antunes disse...

"Un bambino che cresce senza una carezza indurisce la pelle, non sente niente, neanche le mazzate."
Erri De Luca, "Il giorno prima della felicità"
Viva, a voz que sopra a busca
Vale.
Um abraço

zef disse...

Verdade, Rui. "Restam-lhe os ouvidos para aprender o mundo".
Um abraço