31.12.09

Os olhos têm sono:
abriram-se, na manhã lúcida, e viram muito.
Moeram trigo e algum pão foi bonito e gostoso.

Os olhos vão cansados, na espera da noite,
que há-de chegar com elegância,
cheirosa,
levezinha, pão no outono.

23.12.09

Natal

1

Às vezes, ponho palavras num caderno.
São obra desajeitada, mas deram voltas como em oficina de ourives,
como as mãos frias antes de afagar as bochechas dos filhos:
arte de unir as palmas, entrelaçar os dedos,
as palavras e as mãos se aquecerem até a quentura ficar igual.

Junto as palavras como preparo as mãos.
A obra não será perfeita, mas espera merecer algum olhar,
como nos fazem as crianças.

2

Às vezes, as palavras são lisas, latão frio.

3

Mas, quando olhas para mim, vou ao tecto do mundo.
É da tua cara quente.

10.12.09

A ÚNICA ROSA


TÔDAS AS ROSAS são a mesma rosa,
Amor, a única rosa.
E tudo está contido nela,
Breve imagem do mundo,
Amor! a única rosa.

(Juan Ramón Jimenez - Trad. de Manuel Bandeira, Poesia e Prosa,
vol. I; Editôra José Aguilar, Ltda. Rio de Janeiro, D.F., 1958)

7.12.09


Mamá
Bórdame en tu almohada.
(Lorca: poema Canción Tonta))


Quando nasci,
pai?

No nascer do sol,
filho.

O céu tinha as estrelas
como hoje?
Parece a minha colcha bordada.

Pareces o menino da Canção Tonta,
filho.
As estrelas são os teus olhos.

A mãe bordou-os,
foi?
Porque me estás a olhar,
pai?

Por causa da mãe,
filho,
fez os teus olhos.

Agora és tu o tonto,
pai.
Às tardinhas ficas assim.

Por causa das estrelas,
filho.
Vem aí a noite.

E a mãe vai bordar
estrelas?