Dedicatória
Estou triste estou triste
Estou desinfeliz
Ó maninha Ó maninha
Ó maninha te ofereço
Com muita vergonha
Um presente de pobre
Estes versos que fiz
Ó maninha Ó maninha.
(Manuel Bandeira)
Quando tenho vontade de morrer
precisado de ir embora
fito os pássaros e as nuvens
sentado no sol dormente.
Duas pancadinhas nas costas
e mãos a abraçar-me os olhos
o sol fica novo
vamos raptar a luz
Ó maninha Ó maninha.
27.10.08
19.10.08
Ao pôr do sol começou a levantar-se um vento que fez amotinar as areias da praia; a chuva repentinamente começou a cair e ocultou o monte Chokai. Disse para mim mesmo que, se apaisagem com chuva era formosa, sê-lo-ia também sem ela. Com esta ideia pernoitámos na cabana de um pescador, esperando que a chuva cessasse.
No dia seguinte, pela manhã, o céu estava limpo.
(Matsuo Bashô; O Caminho Estreito para o Longínquo Norte - Versão de Jorge de Sousa Braga - Fenda)
17.10.08
Conversitas
- Está-se sempre inteiro nos sítios para onde os humores nos levam.
- A janela aberta diz-nos como está o tempo.
- O sol engole o escuro e tira os cheiros a mofo.
- Está-se sempre todo nos sítios dos amores.
- O tempo julga que a janela é cega.
- Só o sol faz o dia e perfuma os vestidos e os corpos.
- Quem vai calar-se primeiro?
- Pois é! Quem?
- Os corpos já estão perfumados?
6.10.08

Deixei cair uma lágrima na alfazema.
Até onde irá o cheiro roxo grená?
O quintal todo tem ar novo. É da água nas flores, e
ai Deus, que caminho vai levar?
Hei-de querer a força da água, que corre da chuva, e volta à terra.
Ai Deus, e que venha cedo,
e outra lágrima cairá na alfazema, e no alecrim, e na romã,
e o tempo novo,
ai Deus, venha cedo!
3.10.08
O Sentido da Simplicidade
Escondo-me atrás de coisas simples, para que me encontres.
Se não me encontrares, encontrarás as coisas,
tocarás o que minha mão já tocou,
os traços juntar-se-ão de nossas mãos, uma na outra.
A lua de agosto brilha na cozinha
como pote estanhado (pela razão já dita),
ilumina a casa vazia e o silêncio ajoelhado,
este silêncio sempre ajoelhado.
Cada palavra é a partida
para um encontro - muita vez anulado -
e só é verdadeira quando, para esse encontro,
ela insiste, a palavra,
(Yannis Ritsos - Trad. de Eugénio de Andrade: Trocar de Rosa)
2.10.08
FIDELIDADE

Diz-me devagar coisa nenhuma, assim
como a só presença com que me perdoas
esta fidelidade ao meu destino.
Quanto assim não digas é por mim
que o dizes. E os destinos vivem-se
como outra vida. Ou como solidão.
E quem lá entra? E quem lá pode estar
mais que o momento de estar só consigo?
Diz-me assim devagar coisa nenhuma:
o que à morte se diria, se ela ouvisse,
ou se diria aos mortos, se voltassem.
(Jorge de Sena)
Subscrever:
Mensagens (Atom)