estás azedo, pai. já não te oiço as palavras ambíguas que dizias e ficavas à espera das respostas. já sabíamos as respostas que esperavas de cada um e baralhávamo-las.
sim, filho, era um jogo bonito. assim como trazer-vos as prendas já pensadas para cada um e cada um pegar na que era para outro.
sim, pai, sobretudo quando percebíamos que já esperavas que as íamos baralhar todas, como com as palavras, e as tinhas escolhido a pensar nisso e ficava tudo como esperavas.
sim, filho, mas o jogo ficava ainda mais bonito quando as escolhas não eram as que esperava.
mas isso acontecia, pai?
ó menino, deixa-te disso. todos percebiam que sim.
ainda estás azedo, pai?
agora estás tu a jogar. que resposta esperas?
a verdadeira, como quando te respondíamos. brincávamos sempre a sério.
responde: ainda estás azedo?
filho, traz-me uvas de malvasia e os cheiros do monte de quando, logo pela manhã, íamos por campos e cabeços a saltar como cabritos até cairmos a rir. vós éreis o que éreis e nós parecíamos maluquinhos.
pai, ainda estás azedo?
traz-nos uvas de malvasia, filho.